Muitas pessoas acabam sendo desclassificadas de concursos públicos na fase de Investigação Social por responderem a um processo criminal. Entretanto, em resguardo ao princípio da presunção da inocência, não é válida a cláusula do edital de concurso público que impeça a participação de candidato pelo simples fato de responder a inquérito ou ação penal.
A respeito do tema, o julgamento do RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM REPERCUSSÃO GERAL nº 560.900 do STF firmou a tese nº 22:
TEMA 22/ STF - Restrição à participação em concurso público de candidato que responde a processo criminal: Sem previsão constitucionalmente adequada e instituída por lei, não é legítima a cláusula de edital de concurso público que restrinja a participação de candidato pelo simples fato de responder a inquérito ou ação penal.
A discussão versou, especialmente, o Desclassificação em concursos na fase de investigação socialconflito das normas expressas no inciso LVII do Artigo 5º e 37 da Constituição Federal, ou seja, o princípio da presunção de inocência e o princípio da moralidade administrativa.
A solução do conflito entre as duas normas constitucionais apresentadas no caso concreto, com observância à proporcionalidade e racionalidade, pressupõe a formulação de critérios razoáveis e objetivos para aferir a moralidade relacionada a processos penais em curso contra o candidato, com referências a fase em que se encontra o processo e a relação de incompatibilidade entre a acusação e o cargo em questão.
Conforme julgado do RE 56090, a simples existência de inquéritos ou processos penais em curso não autoriza a eliminação de candidatos em concursos públicos, o que pressupõe. uma cláusula de tal natureza somente poderia tomar lugar se houver “(i) condenação por órgão colegiado ou definitiva; e (ii) relação de incompatibilidade entre a natureza do crime em questão e as atribuições do cargo concretamente pretendido, a ser demonstrada de forma motivada por decisão da autoridade competente
Perceba-se que os elementos para justificar uma exclusão são cumulativos como indicado pela conjunção “e”. Ou seja, além de condenação por órgão colegiado ou condenação definitiva, também necessário que o crime da mencionada condenação possua relação de incompatibilidade entre a sua natureza e as atribuições do cargo concretamente pretendido.
Verifica-se, portanto, que há de fato possibilidade de os certames preverem restrições ou limitações em razão da vida pregressa dos participantes com fulcro no princípio da moralidade. Entretanto, ressalta-se que essa limitação apenas é legítima em se tratando de condenação definitiva por órgão colegiado ou sobre matéria concernente a fatos excepcionalmente graves. Portanto, a cláusula que impõe restrições ou limitações não pode abranger simples fatos como a existência de um inquérito ou uma ação penal em curso.
Ademais, é reservado a lei e tão somente a ela - em evidente respeito ao princípio da legalidade administrativa - instituir requisitos mais rigorosos para determinados cargos, em razão da relevância das atribuições envolvidas, sendo vedada, em qualquer caso, a valoração negativa de simples processo em andamento, salvo situações excepcionalíssimas e de indiscutível gravidade. Isto é, não cabe ao certame ou a banca examinadora inovar na matéria legislativa, devendo-se reservar ao que é prescrito em lei.
Sobretudo, este disposto trata sobre o princípio da legalidade na administração pública, o qual estabelece que o estado democrático de direito é o estado submetido a leis democráticas. Assim, a administração pública está, em todas as medidas e em todas suas funções, sujeitada aos ditames da lei, e dela não pode se afastar sob pena de ato ilegal sujeito a invalidade e responsabilidades
Assim, por todo exposto, e conforme RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM REPERCUSSÃO GERAL nº 560.900 do STF que firmou a tese nº 22, conclui-se que:
a) não é legítima a cláusula de edital de concurso público que restrinja a participação de candidato pelo simples fato de responder a inquérito ou ação penal sem expressa previsão legal; e
b) Outras eliminações em razão da vida pregressa pressupõem critérios objetivos e razoáveis, sendo necessário condenação por órgão colegiado ou condenação definitiva e, cumulativamente, relação de incompatibilidade entre a natureza do crime em questão e as atribuições do cargo concretamente pretendido.
Importante mencionar a RCL 47.586/MG, no qual foi proferido julgamento permitindo a exclusão de candidato devido a existência de inquérito sob argumento da exigência de idoneidade moral para o ingresso em carreiras de segurança pública é plenamente legítima e consistente com o texto constitucional.
Importante apontar não haver contradição entre o RE 560.900 e a Reclamação 47.586 de MINAS GERAIS, visto que há a permissão de que lei institua requisitos mais rigorosos para determinado cargos como os de segurança pública, sendo vedada valorações de processos em andamento, salvo situações de indiscutível gravidade
Ou seja, a exceção do RE 560.900 aduz que, para se inadmitir um candidato antes da sua comprovada condenação ou trânsito em julgado, são necessárias circunstâncias excepcionais. Já a Reclamação 47.586 MINAS GERAIS trata sobre a inidoneidade do concorrente, caracterizando assim uma circunstância excepcional grave apta a excluir o candidato.
No caso da Reclamação 47.586 de MINAS GERAIS, o reclamante possuía boletins de ocorrência por tráfico de drogas e ameaça. Ademais, ainda teria mentido para a banca avaliadora ao preencher no formulário de inscrição que nunca teria envolvimento com qualquer tipo de delito.
Ora, fica evidente que tanto pelo envolvimento com drogas e pela suposta agressividade por proferir ameaças, aquele candidato se caracterizava como inidôneo para assumir um cargo na segurança pública.
Em outras palavras, a exclusão de participante devido à existência de investigações ou processos penais ainda sem condenações só podem ocorrer em casos de indiscutível gravidade, caracterizando a inidoneidade do candidato para assumir cargo na segurança pública.